Crônica: Crescendo com os videogames – Parte 2

A era dos fliperamas

Na segunda metade dos anos 80 os fliperamas reinavam absolutos perante os jogos eletrônicos, com a segunda geração de videogames já ficando ultrapassada, a molecada ficava muito louca para ir jogar nos arcades, com gráficos bem superiores, mais bonitos e sonoridade incrível, comparado aos consoles caseiros.

Sempre que chegavam os finais de semana eu e meu irmão ficávamos azucrinando nossos pais para irmos almoçar no Hiper Bom Preço da Prudente de Morais, e não era por causa da comida (apesar do filé a parmegiana que faziam lá ser uma delícia), era principalmente por causa do Playtime (como eram chamadas as casas de arcades daqui) que existia ali. Acostumados com os gráficos do Odyssey e do Atari, quando vimos os fliperamas ficamos loucos com aquilo. Lembrando que o ano era 1988, ainda não existiam os grandes Shoppings de Natal, e o primeiro deles, o Natal Shopping, só foi inaugurado em 1992

Tínhamos as preferências por lá, eu costumava jogar o Elevator Action e o Double Dragon, mas realmente enlouqueci quando vi os jogos da Sega, principalmente o Outrun e o Shinobi. Meu irmão já gostava de gastar suas fichas no Sea Fighter Poseidon, um shooter submarino muito bom – e difícil como todos os outros jogos da época – mas os arcades eram pra serem assim, afinal eles queriam que gastássemos cada vez mais nas fichas, então quanto mais continues, mas grana pra ficha.

Desde esta época eu vidrava nos fliperamas, um jogo que eu era realmente bom foi o Super Mônaco GP. Como eu tinha esse jogo no Mega Drive, já conhecia as pistas de cor nos fliperamas, então isso me dava uma vantagem. Infelizmente não consegui zerar nos arcades, era realmente um jogo muito difícil, o máximo que consegui foi chegar em 5º lugar na ultima pista, e lembro que quando saí do cockpit da máquina, havia uma pequena plateia olhando meu desempenho. Senti-me o próprio Ayrton Senna nesse dia.

Um fato que ficou marcado entre os meus amigos foi quando, certo dia, um colega de escola – hoje meu amigo e colega de trabalho – resolveu ir jogar no fliperama do centro da cidade logo após a aula. Nessa época já era uma grande aventura ir jogar no centro, pois ali era um território bem perigoso, dominado pela gangue do famigerado Ratinho.

Então ao se dirigir em direção ao fliperama o nobre amigo acabou sendo abordado pelo próprio dono do território. Ratinho sabia que ele tinha dinheiro, afinal ninguém vai jogar num fliperama sem grana! Ao abordá-lo, o famoso meliante segurando um canivete na mão, foi logo pedindo para entregar-lhe o dinheiro do jogo, o que calmamente o meu amigo fez. Porém, quando o assaltante já estava partindo, eis que meu amigo grita: “Espere, ainda tem o dinheiro na minha meia!” Bem, Ratinho deu meia volta, pegou o resto do dinheiro, e ainda agradeceu o freguês. Por um motivo óbvio, até hoje esse fato rende boas piadas com esse meu amigo.

O primeiro 8 bits a gente nunca esquece

Um ano depois dessa febre do fliperama, mais precisamente em 1989, meu pai resolveu levar eu e meu irmão à loja Gamemania, uma das primeiras lojas especializadas da cidade, foi lá que descobrimos o incrível Sega Master System, vinha com dois jogos na memória – mais tarde descobrimos um terceiro jogo escondido – e gráficos incríveis, coloridos, com 32 cores simultâneas de 64 disponíveis, um absurdo comparando às 16 cores possíveis com somente 4 sprites suportados do Odyssey.

E o melhor de tudo foi poder ter a chance do jogar aqueles jogos que só havia nos fliperamas, mal podia imaginar que um dia eu iria poder jogar um Double Dragon, Shinobi ou Outrun na sala da minha casa. A partir desse dia virei seguista de carteirinha.

Tiro, porrada e bomba – não, era só uma caça ao pato mesmo!

Quando ganhamos o 8 bits da sega, meu pai comprou junto com ele a linda Pistola Light Phaser, com o design inspirado no anime Zillion. Um dos jogos que vinha na memória do console era o Safari Hunt, um tipo de caça ao pato da Sega, e só era possível acessá-lo plugando a pistola no player 1, ligar o videogame e meter chumbo na tela.

Aquilo realmente me surpreendeu, eu podia mirar em qualquer objeto se movendo na tela e pow, tava lá um pato caindo do céu, ou um tatu estirado no chão. Divertimos-nos muito com os jogos de tiro do Master, aliás, os únicos que meu pai se arriscava em jogar. Lembro quando ele chegou com um jogo novo, era o Wanted! Meu pai sempre foi fã do faroeste, desde os clássicos do cinema até as revistas Tex, ele é um aficionado pelo gênero, então acho que quando viu esse jogo nas prateleiras ele deve ter pensado que iria viver um pouco a sensação que tinha nos filmes. Ledo engano, ele mal podia aproveitar o jogo, que se resumia a apenas alguns tiros na tela, eu e meu irmão que tomamos conta da arma, até o dia em que conseguimos zerar o jogo.

O primeiro game a zerar e o surgimentos das revistas

Com o passar do tempo fomos adquirindo novos jogos e, acreditem, eles sempre foram caros, principalmente numa época que não existia os “genéricos” do Paraguai, então jogos para o Master System somente os originais da Tec Toy. O primeiro cartucho que tivemos foi o Super Futebol, comparado com os que conhecíamos do Atari e do Odyssey, aquilo foi uma revolução de cores e de som, ficava entusiasmado só em escutar o hino das seleções quando as selecionávamos. Porém era um jogo muito simples, não havia campeonatos ou copas para disputar, as disputas eram únicas e eventuais, tendo destaque para as disputas de pênaltis, onde o perdedor dava lugar para outro jogador.

Logo os tão sonhados jogos dos fliperamas viriam a nossa casa. O primeiro que chegou foi o Altered Beast, tinha uma arte belíssima na capa e era um pesadelo tentar jogar este jogo nos arcades, você teria que desembolsar muita grana nas fichas se quisesse salvar a filha de Zeus das mãos do Nefasto Neff.

No Master System a dificuldade era menor, mas isso não o tornava um jogo fácil, conseguia sempre chegar à fase final, mas sempre acabava com minha ultima vida, mesmo utilizando as Master Dicas que vinham no manual de instruções do jogo, eu simplesmente não conseguia derrotar o Neff.

Foi então que as valiosas revistas começaram a surgir, comecei a comprar aos montes as Top Games e Ação Games que saiam nas bancas, e uma delas trouxe dicas valiosas para o bendito jogo, descobri um modo de aumentar minhas barras de vida, então finalmente consegui derrotar o Nefasto Neff. Foi uma sensação de vitória, ver aquele monstro explodindo e a bela Deusa surgindo, até hoje me lembro de cada nota daquela música final, era o hino da vitória!

Veraneio: praia, body boarding e jogos de verão

Mês de janeiro, aproveitando as férias escolares, sempre íamos a praia de búzios, e a rotina era simples; aproveitávamos a luz do sol para curtir a praia, pegar umas ondas, jogar uma pelada, e a noite era a hora da jogatina, quando não estávamos jogando War ou dominó, estávamos vidrados na frente da TV disputando recordes no Jogos de Verão.

O jogo era do nosso vizinho Jailson que também tinha um Master System, e as disputas eram revezadas entre as casas, uma noite na minha outra na dele. As partidas eram acirradas, entre as várias modalidades; no patins, half-pipe, foot bag e freesby, sempre o placar era apertado. Mas tinha uma modalidade que eu e meu irmão nos destacávamos, era o Surf! Não era raro tirarmos a nota 9.9 dos jurados (sempre tinha aquele mesmo jurado babaca que dava nota 9.0, enquanto todos os outros nos davam 10.0). Parecia que essa era a nota máxima, ninguém nunca conseguiu tirar mais que isso. Então, pelo menos nessa modalidade, eu e meu irmão éramos os reis da praia.

Os ânimos nas jogatinas na praia de búzios eram bem acirrados, chegando ao ponto de quase haver um término de namoro por causa de uma partida de War. Mas isso é até justificável (ou não), antes do início do jogo, todos macumularam (inclusive esse que vos escreve) em sabotar o jogo, eram todos contra meu irmão. O motivo? Ele era o rei do War, ganhava 99% das partidas, e nós, meros mortais, já estávamos meio chateados de vê-lo sempre ganhar. Então foi quando o meu velho e bom amigo, Zequinha, veio com a ideia de todos atacarem meu irmão até seu exército sumir, literalmente, do mapa.

O resultado foi óbvio, logo os exércitos do meu irmão foram se esvaindo até não sobrar nenhum pra contar a estória. Ele estava até conformado com a humilhante derrota, aceitando bem o inevitável resultado, até que o próprio autor do plano diabólico soltou: “Pronto, já derrotamos Júnior, vamos começar outra partida!”. Essas palavras soaram como um estopim nos ouvidos do meu irmão – ele não sabia do plano até então – sua fúria foi tão grande que ele jogou o tabuleiro para longe, creio que até hoje devam ter peças do War espalhadas nas areias de Búzios.

Então era nesse clima amistoso que fazíamos nossas disputas, seja lá do que fosse. Mas os motivos eram vários, podia ser uma trapaça no dominó, Banco imobiliário, e quase sempre no War (meus amigos Zequinha e Jailson que o digam). Até mesmo no videogame se conseguia trapacear, mas ali era mais nítido, bastava um passar propositalmente em frente a TV, soltar um grito na hora errada (ou certa, dependendo do referencial) que já era motivo para xingamentos.

Esses veraneios na praia de Búzios estão marcados pra sempre, não só na minha vida, como na de todos que vivenciaram tudo aquilo. Ainda hoje gosto de ir pra lá. Infelizmente não existem mais as jogatinas, o body board, nem mesmo os Jogos de Verão. Muita coisa mudou, e o que ficou daquela época foi apenas uma bela lembrança que levarei pra sempre comigo. Foram dias felizes com amigos e familiares, espero um dia poder reviver tudo isso de novo, embora a correria do mundo adulto não nos permita mais.

O fantástico mundo 3D

Um dos assessórios mais cobiçados na época era o óculos 3D do Master System. Tinha um visual futurista e garantia a imersão nos jogos, trazendo você a uma verdadeira realidade virtual. Colocava você dentro do jogo, pelo menos era o que dizia a propaganda.

Quando ganhamos o periférico, ficamos bastante empolgados em descobrir como era entrar no jogo, e junto com o óculos veio também o jogo Space Harrier 3D. Então apressamos logo meu pai para puder ligar o tão revolucionário jogo, o que foi um pouco decepcionante.

Na cabeça de uma criança, o que se esperava, com o que dizia a propaganda, era que realmente entrássemos no jogo, ficássemos dentro daquele mundo alienígena atirando em diversos monstros, o que na realidade não foi bem assim.

No início dos anos 90 as propagandas eram feitas para nos iludir, basta lembrarmos-nos do carro Colossus cuspindo fogo pelo cano de escape, e diversas outras propagandas que, com certeza, hoje seriam proibidas pela ANVISA por querer enganar os consumidores.

Claro que um adulto dificilmente seria ludibriado com aquele marketing, mas uma criança de 10 anos, com certeza seria. E eis minha frustração ao colocar os óculos e não entrar na televisão.

Mas calma, o óculos funcionava sim, e muito bem, dava a sensação de profundidade e víamos os tiros se aproximando, era muito bacana aquela tecnologia, inovadora para época. Porém, para uma criança que esperava bem mais, foi deveras frustrante.

O jogo secreto

No início dos anos 90 surgiu um boato de que havia um jogo secreto no Master System, todos queriam saber que jogo era esse! Como assim um terceiro jogo na memória? Foi aí que a revista Ação Games veio com a descoberta. Ao pressionar os botões 1 e 2 e em seguida colocar o direcional para cima, na famosa tela da Sega, a tela começa a se deslocar e surge o jogo do labirinto!

Isso mesmo, depois de anos com o console, eis que descobrimos este easter egg que só a Sega poderia nos dar. Então foi uma festa grande quando fizemos todo o procedimento que a revista dizia e a tela a se moveu para a esquerda e começou a surgir o tão falado jogo secreto.

O jogo era muito simples, se tratava de um labirinto cujo objetivo era encontrar a saída antes do término do tempo. À medida que vencíamos o cronômetro, um novo labirinto surgia até chega ao décimo e derradeiro. Ao vencer uma simples mensagem de congratulações (congratulations!) aparecia na tela e o jogo chegava ao fim. Era muito simples mesmo, mas só o fato de existir o boato e constatarmos que este era verdadeiro, já foi uma sensação incrível de descoberta, principalmente por se tratar do primeiro easter egg de um videogame que se tenha conhecimento!

Adeus ao antigo, boas vindas ao novo!

Como era comum, com a evolução de toda tecnologia, chega a 4ª geração de consoles e o Master System passou a ser oficialmente obsoleto. Queríamos o novo, queríamos saber como aquela tecnologia poderia melhorar, então passamos a almejar o novo videogame da sega, o Mega Drive e seus incríveis 16 bits.

Videogames, como eu já havia dito, eram mercadorias caras, e para ajudar a comprar o novo teríamos que nos desfazer do velho. Estávamos ansiosos para passar à próxima geração, como seriam os gráficos, os jogos? Era tudo novo e queríamos ver a evolução dos games, coisa que só podíamos vislumbrar nas revistas.

Então chegou a hora de dar adeus ao velho companheiro para que pudéssemos continuar nessa jornada evolutiva dos games, tão logo anunciamos a venda do querido Master System, logo apareceu um comprador, pagou o valor que foi pedido, pôs o console embaixo dos braços e se foi, para nunca mais rever meu velho amigo.

Sair da versão mobile