Crônicas da Velha Ribeira (19)

Geraldo França Vieira – hoje aposentado e gozando as delícias de viver à beira- mar na praia da Redinha – foi um dos mais atuantes empresários no comércio de automóveis no bairro da “Ribeira”, nesta Cidade do Natal.

Formado na Universidade da Vida, tirou Ph.D na arte de comprar, vender e trocar carros novos e usados ao longo de mais de quarenta anos exercendo esse mister. Quem trabalhou naquele ramo, numa época em que as coisas eram diferentes, algumas até rudimentares em relação aos tempos atuais, conhece bem as centenas de mumunhas que o cercavam. Desde o pecado venial de baixar a calibragem dos pneus do carro que se queria vender ou trocar, para que o comprador tivesse a impressão de que se tratava de “uma bolinha de borracha” – jargão próprio da atividade – ao testa-lo em ruas de paralelepípedos, até a prática criminosa de colocar banana verde no diferencial, para encobrir-lhe o “ronco”, quando o desgaste de carretas e rolamentos já era muito grande.

Mas esses truques dificilmente “colavam” em cima dele, porque Geraldo era uma verdadeira raposa naquela área e tinha experiência de sobra pra detecta-los.

Todavia, se um indivíduo toma a decisão de “passar a perna” noutro, por mais arguto que seja este último, provavelmente um dia o pegará desprevenido e ele poderá cair nalgum tipo de ludíbrio, que, – adredemente preparado – é arma de muitos megatons na mão do inescrupuloso…

E não existe nenhum cidadão neste mundo, mesmo entre os mais inteligentes e preparados, que não tenha passado, em alguma ocasião, por um momento de descuido, uma abertura na guarda..

Pois foi assim que aquele camarada, experto comerciante local e homem capaz de muitas “mágicas”, saiu levando a melhor na troca de uma Kombi na loja de Geraldo.

Ele chegou lá, na parte da manhã, levando sua Kombi usada e em bom estado de conservação para ser avaliada e recebida como parte do pagamento na troca por uma outra, mais nova.

O veículo foi examinado, testado, avaliado – principalmente o funcionamento do motor – e, sem muita demora, o negócio foi fechado.

Daí que, de repente, o sujeito “lembrou-se” que tinha um compromisso urgentíssimo e não poderia perder tempo esperando as formalidades da venda. Pediu a Gerando que preparasse a papelada atinente à troca enquanto ele iria, ainda na sua Kombi, atender àquele compromisso e voltaria mais tarde para entrega-la e pegar a que tava comprando.

E aí, Geraldo – digamos assim – não “ligou o desconfiômetro”, como deveria ter feito, até porque o cabra tinha fama de “muito sabido” e a “luz vermelha” era p´ra ter piscado diante daquela proposta surgida de última hora…

Permitiu que o sujeito levasse o carro – que informalmente já era seu – e ficou à espera de sua volta, o que só aconteceu no fim da tarde, já quase terminando o expediente. Apressadamente, o camarada assinou os papeis da troca, deixou sua Kombi e levou a outra.

Na manhã seguinte, quando Geraldo mandou seu fiel escudeiro e competente mecânico Lauro revisar a que recebeu, a bicha num prestava. O motor tinha sido trocado!

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