Crônicas da Velha Ribeira (49)

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Foi dito em outras linhas deste recanto que um dos restaurantes mais famosos da cidade, nos anos 1950/1960 era a Carne Assada do Lira, localizado na confluência desta Velha Ribeira com o bairro das Rocas.

Aquela famosa casa não teve continuadores na família, apesar das tentativas dos descendentes do legendário Júlio Lira, em épocas e locais diferentes. Parece que, para a continuidade do tremendo sucesso alcançado anteriormente, faltou o “aplomb” e o toque mágico do velho mestre, características que o tornaram famoso.

Todavia, cabe registrar que aqui no velho bairro existiu um outro restaurante especializado em carne de sol, pois até mesmo antes de Júlio Lira retirar-se para o merecido descanso, “seu” Marinho abriu uma casa bem mais modesta, na rua General Glicério, que começa nos fundos da igreja Bom Jesus e vai até o Jacó.

“Seu” Marinho e dona Rita, sua esposa, ofereciam uma carne de sol no mesmo padrão criado por Lira. Digo isso com a experiência de quem frequentou os dois, dos quais fui amigo. Lira, mais arredio e “fechadão”, conheci em 1962, quando comecei a frequentar seu restaurante e estreitamos a amizade no decorrer dos anos porque ele era cliente do Banco Nacional do Norte, onde eu trabalhava.

Com “seu” Marinho, meu conhecimento era superficial mas num desses acasos da vida, um incidente fortuito nos aproximou e tornamo-nos amigos.

Embarquei num velho 727 da Cruzeiro do Sul para uma viagem “pinga-pinga” Natal/São Paulo com escalas em João Pessoa, Recife, Salvador e Rio de Janeiro. No entanto, o bicho não pousou em João Pessoa porque – segundo aquele aviso que sempre dão nos aviões e que nunca reflete a verdade – tava com problemas técnicos que só se resolveriam no Recife e foi lá que pousamos. Lembro-me bem das palavras do comandante quando desceu do avião, que ouvi com clareza, porque ainda estava perto da escada: “não vou mais voar nessa merda!”.

Entre os passageiros, uma mocinha meio assustada me chamou a atenção e sentiu-se grata quando me aproximei e ofereci ajuda. Ela havia sido colocada no avião por familiares – era a primeira vez que entrava num deles – e outros familiares a esperavam no Rio de Janeiro. Disse-me ainda que era filha de “seu” Marinho, da carne assada…Ora, quando voltei ao restaurante, algum tempo depois, ela disse aos pais: “Foi esse home que me ajudou, no avião”.

Daí p´ra frente, todas as vezes que fui lá, a carne que vinha à minha mesa era “especial”, tanto na qualidade quanto no esmero, no preparo.

Certa vez, quando a Marpas era concessionária Volkswagen, esteve aqui o Sr. Heinz Gundlach, que foi presidente daquela montadora.

Levamo-lo lá, “seu” Marinho deu a costumeira caprichada especial na carne de sol e quando veio aquele pedação de chã de fora com dois dedos de gordura capeando a posta, o alamão atirou-se a ela com tal voracidade que o suor pingava em grossas gotas, pela face bochechuda e muito vermelha…

Quando “seu” Marinho faleceu, Dona Rita ainda continuou por uns tempos.

Mas, depois fechou o restaurante e passou a receber encomendas de carne assada em casa. Porém, isso também não foi por muito tempo.

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