Ciência potiguar em destaque

“Não adianta produzir, tem de publicar”. Comum no ambiente acadêmico desde os bancos da graduação, essa frase se torna ainda mais presente nos cursos de pós-graduação das universidades, nos quais as pesquisas geram resultados importantes e que, portanto, merecem ampla divulgação para conhecimento da comunidade. As revistas científicas entram nesse contexto com o papel de compartilhar as produções dos pesquisadores em âmbito nacional e internacional, como forma de contribuir para as cooperações e o aproveitamento dos estudos no desenvolvimento de novas soluções.

Entre as milhares de publicações, algumas se destacam pela repercussão gerada na comunidade científica, que pode ser medida a partir da quantidade de citações em trabalhos de outros pesquisadores. A avaliação se estende às instituições nas quais as pesquisas foram desenvolvidas, de modo a identificar os lugares onde existem as produções de qualidade com maior impacto científico. Nesse quesito, a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) assume a 13ª colocação entre as universidades brasileiras, conforme o relatório Research in Brazil: Funding Excellence, elaborado pela empresa Clarivate Analytics, que analisa a qualidade das publicações nas principais revistas científicas do mundo.

O levantamento levou em consideração a produção científica nacional entre 2013 e 2018 e foi realizado a pedido da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), do Ministério da Educação (MEC). Em relação à UFRN, a produção está acima da média nacional nas áreas de Ciências Biológicas, Ciências Agrárias, Engenharias e Ciências Exatas e da Terra, com esta última também destacada nos índices de impacto de citações superiores em 43% à média internacional. De acordo com a pró-reitora de pesquisa da UFRN, Sibele Pergher, o resultado advém do trabalho de grupos de excelência existentes na universidade cujas pesquisas de alta qualidade alcançam relevância internacional.

Qualidade das pesquisas desenvolvidas na UFRN atrai interesse da comunidade científica internacional – Imagem: Cícero Oliveira

“Quando há excelência é mais fácil inovar, ditar caminhos e buscar recursos. Uma das estratégias para elevar esses índices é juntar os grupos de pesquisa em redes, focando em áreas temáticas, para formar outros grupos de excelência e continuar fortificando os que já existem”, afirma a professora, que aponta os laboratórios multiusuário como espaços para interação das diferentes áreas. A pró-reitora adjunta de Pesquisa, Elaine Gavioli, ressalta que a qualidade é mais importante que a quantidade, “pois significa visibilidade, interesse naquela informação produzida para aplicação. Se ela é citada, significa que é vista e compartilhada. É importante porque as pessoas se referenciam dessa informação”.

As publicações científicas estão concentradas principalmente nos programas de pós-graduação da universidade, nos quais grande parte das pesquisas é desenvolvida. Segundo o pró-reitor de Pós-Graduação da UFRN, Rubens Maribondo, o alto impacto contribui para a cooperação internacional, já que a instituição passa a ser referência em algumas áreas de conhecimento, assim como facilita a aprovação junto a órgãos de fomento nacional e internacional dos projetos de pesquisa nas áreas de destaque. “O resultado é fruto do trabalho de 41 anos na pós-graduação. Ampliamos o número de programas, cursos de doutorado, bolsistas de produtividade, infraestrutura. Vamos chegar além se continuarmos na mesma linha, apoiando ciência de qualidade, não quantidade”, conclui. Atualmente a UFRN dispõe de 93 programas de pós-graduação, que representam 132 cursos. Destes, 42 possuem doutorado.

Para o reitor da UFRN, José Daniel Diniz Melo, o destaque da universidade reflete o esforço do planejamento institucional e de todas as pessoas envolvidas no apoio às pesquisas, entre estudantes, professores e servidores técnico-administrativos. “Isso tem feito com que a instituição tenha crescido em número de publicações e na qualidade destas, além do fortalecimento da atividade de inovação, que também é marca importante da UFRN em nível nacional”, adiciona. O gestor avalia que o levantamento atesta a relevância social das pesquisas, motivo pelo qual serão mantidas as estratégias para seu fortalecimento.

Pesquisas de qualidade

Entre os grupos de excelência na UFRN está o Laboratório de Propriedades Físicas e Materiais Cerâmicos (LaPFiMC), do Programa de Pós-Graduação em Ciência e Engenharia de Materiais (PPGCEM) – único da instituição que possui conceito máximo na avaliação da Capes. Nesse laboratório, são conduzidas pesquisas com materiais cerâmicos tradicionais e avançados, usados como matéria-prima para a criação, por exemplo, de tijolos a partir do resíduo da perfuração de petróleo e de outros resíduos cerâmicos, além de produtos regionais como a xelita e a manipueira – líquido extraído da mandioca. O conforto térmico dos produtos está em fase de testes e patentes nessa área estão em processo de desenvolvimento.

O trabalho do grupo já rendeu a conquista de uma carta-patente neste ano, recebida pelo coordenador do LaPFiMC, professor Wilson Acchar, juntamente com o pesquisador Eduardo Jorge Vidal Dutra, pelo invento de massas cerâmicas para pisos e revestimentos com adição de cinzas da casca do café. Outros pedidos de patentes foram depositados e aguardam a concessão pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), processo que demora uma média de oito anos.

As pesquisas do laboratório incluem a criação de materiais cerâmicos nanoestruturados, para uso industrial no torneamento de outros produtos. A fabricação de fitas cerâmicas, por sua vez, divide-se em uma linha de trabalho voltada ao desenvolvimento de materiais com propriedades elétricas e magnéticas, para aplicação eletroeletrônica, e outra concentrada nos biomateriais, utilizados em dispositivos médicos como enxertos ósseos, curativos e implantes, para interação com os sistemas biológicos. Um dos produtos em desenvolvimento são as fitas com argilas, para a liberação controlada de fármacos na pele. A pesquisa é conduzida pela aluna do PPGCEM, Anna Karla de Carvalho, sob orientação do professor Wilson Acchar.

A estudante está entre os inventores de uma patente depositada no ano passado, como resultado do seu mestrado. Autora de dois artigos já publicados, atualmente escreve um terceiro sobre o atual trabalho em execução no doutorado. “Nós fazemos pesquisa para a sociedade. As publicações são importantes para divulgar o que é feito aqui”, declara a doutoranda, que pretende estudar parte da pós-graduação na Alemanha. “A produção técnica e científica de qualidade é excelente para os alunos”, defende Wilson Acchar, ao citar que os candidatos com publicações são melhor avaliados nos processos seletivos.

Pós-graduação em destaque

A excelência da produção é fator determinante para o conceito dos programas de pós-graduação, conforme ressalta Wilson Acchar. “Temos mantido o nível de qualidade e nossa esperança é de que, na avaliação do ano que vem, o PPGCEM continue com a nota 7 da Capes, que para nós é motivo de satisfação e significa mais recursos, mais bolsas para os alunos e oportunidades de trabalho no exterior. Temos, atualmente, alunos no Canadá, Estados Unidos, Alemanha, Espanha”, detalha. A internacionalização ainda permite a vinda de professores e universitários de outros países para a UFRN, o que proporciona trocas de conhecimentos e experiências com toda a comunidade acadêmica.

Wilson Acchar acumula 135 artigos publicados em revistas internacionais, 67 alunos de mestrado e doutorado, cinco supervisões de pós-doutorado, sete livros, uma carta-patente e outras depositadas – Imagem: Anastácia Vaz

O mesmo benefício é apresentado pelo professor do Programa de Pós-Graduação em Ecologia (PPGECOL/UFRN), Adrian Garda, que atribui à repercussão das pesquisas o aumento da rede de colaborações nacionais e internacionais. Outros resultados são o reconhecimento do programa, com conceito 6, além do sucesso alcançado pelos egressos em universidades, agências governamentais e Organizações Não-Governamentais (ONGs) na área de desenvolvimento sustentável. “Os índices de citação dos trabalhos também vêm registrando escalada grande. O corpo docente publica uma média de quatro a cinco artigos por ano, mas a nossa publicação é tendenciosa para os extratos mais altos, em periódicos com mais impacto – A1, A2 e A3 – e muitas dessas publicações são feitas com discentes”, cita.

Com pesquisas focadas em répteis e anfíbios, Adrian Garda realiza estudos há 10 anos sobre espécies da Caatinga. Mais de 20 expedições, cada uma com 30 dias de duração, possibilitaram o descobrimento de questões básicas sobre quais espécies ocorrem e onde se encontram no bioma, até respostas maiores e históricas: como elas vivem, o que aconteceu no passado, qual a diversidade real e como se comportaram ao longo do tempo. “Partimos para a análise da diversidade genética dessas espécies em toda a Caatinga. Além de coletar amostras dos animais, passamos a sequenciar fragmentos do DNA de várias espécies”, explica o professor, que lançou mão de metodologias computacionais para identificar o sinal genético de expansão recente.

Adrian Garda expõe coleção de tecidos do Laboratório de Anfíbios e Répteis da UFRN, que conta com acervo de mais de 10 mil amostras de diferentes espécimes – Imagem: Anastácia Vaz

O estudo genético também levou ao descobrimento de cinco espécies não descritas anteriormente, além de mais dez em andamento. De acordo com Adrian Garda, esse trabalho tem relevância regional e nacional, visto que o planejamento de conservação é voltado apenas às espécies conhecidas. “Durante muito tempo, a gente tinha uma determinada ideia do que seria essa diversidade, em torno de 50 espécies de anfíbios e 60 espécies de lagartos. Em trabalho recente publicado, subimos essa diversidade para 98 anfíbios e quase 80 lagartos na caatinga”, salienta o professor, ao adicionar que aproximadamente 40% dos lagartos e 30% dos anfíbios são encontrados apenas nesse bioma.

Essas e outras descobertas devem ser difundidas, alega o pesquisador. “Temos disciplinas de redação científica para incentivar os alunos a publicar, essa é uma cultura muito importante. Acho isso crítico e fundamental para o programa dar certo. Se fizermos ciência de alta qualidade, gerarmos artigos de boa qualidade e trabalharmos com respeito, a excelência vem como resultado”.

Fonte: Agecom UFRN

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