A diferença entre aquele que assiste e o que espera – Por João Maria de Lima

A diferença entre aquele que assiste e o que espera - Foto: Shutterstock

As semelhanças de grafia e pronúncia de palavras de sentidos diferentes e até mesmo opostos perturba o dia a dia de quem escreve e fala. Muitas vezes, ratifica-se aquilo que deveria ser retificado. Quantos concertos se realizam em lugar de consertos! Isso sem contar os desencontros de quem vai a seções, quando deveria ir a sessões. Muita gente vai de encontro à língua, em vez de ir ao encontro dela. E, ainda, há casos em que o som é igual, mas a grafia é diferente. Sem dúvidas,os homônimos e parônimos são assunto dos mais propícios para se cair em pecado.

Vamos começar pela diferença entre aquele que assiste a algo (o espectador) e aquele que espera (o expectador), frequente motivo de confusão: o espectador vê o jogo; o expectador diz que a esperança venceu o medo.

Outro dia, em uma análise literária, alguém pouco atento à análise linguística soltou: “O autor desmistificou o herói.” Como o herói deixou de ser um mito, ele foi desmitificado, e não “desmistificado”, pois desmistificar significa desfazer o engano.

Uma das recomendações mais lidas nesta quarentena, em uma rede social: “É necessário se ‘previnir’ contra os assaltos.” Alguém mais prevenido se protege também contra pequenos assaltos ortográficos que trocam o “e” pelo “i” e escreve “prevenir”.

Outra expressão que passa “despercebida” (não notada), e não “desapercebida” (desprevenida), pela fala e escrita e ninguém a interrompe é “a grosso modo”, que não existe. A expressão italiana que, por isso, deve ser utilizada entre aspas é “grosso modo”.

Uma frase cuja análise depende do locutor é “As medidas do governo vão de encontro aos anseios da população”. Se o enunciador faz parte do governo e não teve a intenção de criticá-lo, deslizou e muito na gramática, pois “de encontro a” indica “em prejuízo de”; logo deveria ter dito que as medidas vão ao encontro dos anseios da população. No entanto, se o enunciador integra o time da oposição, a frase passa a ter sentido.

Talvez, as expressões que mais causem dificuldades neste assunto sejam “demais” e “de mais”. É comum as pessoas, mesmo as cultas, confundirem essas duas formas, cuja diferença é sutil. Quando se opõe a “de menos”, a grafia correta é “de mais”, como neste exemplo: “É uma questão de mais ou de menos valia”. Em todos os “demais” casos, a grafia correta é “demais”.

O par “tampouco”/“tão pouco” pode ser facilmente compreendido se observarmos o seguinte: sempre que for possível substituir por “também não”, será “tampouco”, pois é esse o sentido: Ele tampouco virá. Nos outros casos, o “tão” significa “tanto”: O atleta era tão pouco conhecido, que sua vitória surpreendeu o mundo.

Não podemos esquecer a confusão que se fazia com “infarto”/“enfarto” (que não existia) e “enfarte” / “infarte” (que também não estava registrada). O dicionário eletrônico Houaiss já contempla todas as formas. Mas, atenção: independente da forma utilizada, o melhor mesmo é que ele não aconteça.

João Maria de Lima é mestre em Letras e professor de língua portuguesa e redação há mais de 20 anos.

profjoaom@gmail.com

Crédito da Foto: Shutterstock

 

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