Governo Federal fez anúncios de medidas contra pandemia em canais com notícias falsas

Um levantamento feito pela CNN Brasil indica que parte da verba publicitária destinada para ações contra a pandemia de Covid-19 foi veiculada em páginas que divulgam informações falsas e são investigadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no inquérito sobre fake news.

Canais de políticos, entre eles o do presidente e de seus filhos Eduardo, Flávio e Carlos, também veicularam anúncios por meio da plataforma Adsense, do Google, apesar de terem apresentado uma monetização baixa. Ao todo, o Ministério da Saúde investiu ao menos R$ 1,9 milhão em anúncios na internet relacionados a ações de combate ao novo coronavírus. As páginas nas quais a publicidade aparece são definidas automaticamente, mas quem veicula a propaganda tem a opção de bloqueá-la.

Entre fevereiro e maio deste ano, foram veiculados ao menos 2,6 milhões de anúncios em 616 mil páginas na internet e canais no YouTube. O conteúdo dos vídeos veiculados gira em torno de ações para combater a pandemia, como o isolamento social e o uso do TeleSUS, serviço de atendimento pré-clínico de saúde, segundo as planilhas a que a reportagem teve acesso por meio da Lei de Acesso à Informação.

CNN encontrou ao menos 291 canais cujo custo do anúncio foi de ao menos R$ 1 mil. Esse valor é calculado automaticamente a partir do número de visualizações e outras métricas. O perfil dominante dentre os canais que receberam os anúncios é de entretenimento, como páginas de música, jogos, infanto-juvenis, de curiosidades em geral e até dois site chineses sem conteúdo no Brasil.

Mas a reportagem encontrou ao menos sete que já veicularam informações comprovadamente falsas e conteúdo sensacionalista e figuram entre os mais bem remunerados.

Também figuram entre os que receberam anúncios os canais Terça Livre, de Allan dos Santos, do blogueiro Oswaldo Eustáquio, Sara Giacomoni (Sara Winter), todos investigado no chamado inquérito das fake news no STF.

Apoiadores do presidente, como os deputados federais Marco Feliciano, Bia Kicis e o empresário Luciano Hang também integram a planilha dos que tiveram alguma inserção publicitária. O Youtube de Olavo de Carvalho, que chegou até a indicar ministros a Bolsonaro, também aparece na lista.

Não é possível saber quanto essas pessoas ganharam com os anúncios. O valor exato recebido pelos donos dos canais é desconhecido, porque no custo está incluído a parcela absorvida pela plataforma da Google.

Seleção automatizada 

O anúncio, feito com ferramentas do Google, é uma inserção automática e não conta com uma seleção proativa por parte do governo. Isto significa que não houve uma decisão específica em anunciar em uma página ou outra. Os gestores da campanha publicitária definem orçamento e os parâmetros para escolher o público alvo para buscá-lo onde estiver na internet.

O algoritmo, a partir desses parâmetros da plataforma, exibirá anúncios a partir do perfil do usuário, em conteúdos que ele consumiu antes, páginas que navegou e vídeos que assistiu, por exemplo. E a empresa de tecnologia fica responsável por fazer a intermediação. Não é possível saber ao certo quanto cada uma das páginas recebeu, pois os valores variam de acordo com uma série de fatores. Por causa desse método de divulgação, até fortes opositores à atual administração, como o youtuber Felipe Neto que gera milhões de visualizações por vídeo publicado, também receberam inserções.

Apesar de não escolher exatamente a página em que o anúncio será veiculado, as ferramentas da plataforma permitem que o gestor da campanha faça o bloqueio de determinados tipos de canais ou conteúdos para não associar a publicidade a perfis indesejados ou até mesmo bloquear um site específico por meio do link. Os donos dos canais também podem bloquear anunciantes que não queiram.

Este é o mesmo tipo de anúncio que já gerou questionamentos da Câmara dos Deputados na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Fake News. Um relatório produzido pela casa, com informações de 2019, aponta para sites com informações falsas, pornografia e jogos de azar.

O ministro Vital do Rêgo, do Tribunal de Contas da União (TCU), determinou em julho ao Ministério das Comunicações para parar de direcionar recursos de campanhas publicitárias a esse tipo de site. A decisão, no entanto, se referia a campanhas do governo do ano passado, relacionadas à Reforma da Previdência. Nada tinha sido divulgado até o momento sobre as campanhas na internet relacionadas à Covid-19.

Governo vê necessidade em falar com a população

Procurado, o Ministério da Saúde afirmou que existe uma ampla necessidade de falar com toda a população, para que seja orientada e tenha conhecimento sobre as políticas públicas adotadas pela área da saúde.

Reforçou que a programação do Google é feita por meio de público alvo de forma automatizada. “O Ministério da Saúde não determina os locais da exibição dos anúncios, nem a URL para entrega da publicidade”.

Disse ainda que a pasta não tem competência para classificação dos conteúdos editoriais das páginas em que veicula publicidade e são respeitadas as definições legais sobre conteúdo ilícito.

A pasta também ressaltou que o Google e a agência de publicidade analisam os relatórios para que os valores veiculados nesses canais sejam abatidos das veiculações conforme orientações do TCU no processo que envolve a Secom.

Por fim, o ministério afirmou que pausou esse tipo de anúncio por causa dos apontamentos do TCU para que fossem feitas melhores análises das entregas para “melhorar a veiculação no canal, visto que, do ponto de vista de cobertura e economicidade, o veículo consegue de forma ampla realizar a entrega do governo federal.”

Google diz ter controle contra abusos

O Google informou, em nota, que “tem ajudado parceiros do setor privado e do setor público a usar a publicidade digital para levar suas mensagens a milhões de brasileiros de modo eficiente, com escala, eficiência e alcance”. Afirmou que suas plataformas “oferecem aos anunciantes e agências controles robustos que permitem o bloqueio de categorias, palavras-chave e sites específicos, além de gerarem relatórios em tempo real sobre onde os anúncios foram exibidos, por entender que “os anunciantes podem não desejar seus anúncios atrelados a determinados conteúdos, mesmo quando estes não violam as nossas políticas”.

Fonte: CNN Brasil

Imagem: Freepik

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