Ambiguidade: as confusões da língua – Por João Maria de Lima

Ambiguidade: as confusões da língua - Foto: Reprodução / Portugues.com.br

Uma mesma palavra pode apresentar sentidos variados, dependendo do contexto em que é empregada. A ciência que estuda a significação das palavras chama-se semântica. Entre os assuntos tradicionais ligados à semântica destacam-se: a sinonímia, a antonímia, a hiponímia, a hiperonímia, o campo semântico e a polissemia, que se referem ao sentido das palavras; e a ambiguidade ou a duplicidade de sentidos, que diz respeito a frases completas.

Vamos nos ater à ambiguidade, isto é, ao uso de palavras, expressões ou frases com mais de um sentido, que pode ser um interessante recurso de expressão, quando empregada em histórias em quadrinhos, anúncios publicitários, textos poéticos e humorísticos. Mas, ao contrário disso, será defeito em texto referencial, como artigo de opinião ou redação em concurso.

Assim, todo cuidado é pouco para não prejudicar a clareza e a precisão das ideias, e para não dificultar a compreensão da leitura. Isso ocorre, principalmente, quando a ambiguidade é causada por pontuação imprópria, problemas de construção lexical e/ou emprego de palavras com mais de um sentido, que podem gerar, de forma não intencional, mais de uma possibilidade de interpretação. Em uma frase como “O computador tornou-se um grande aliado do ser humano, mas esse nem sempre realiza todas as suas tarefas”, as palavras “esse” e “suas” podem referir-se tanto ao computador quanto ao ser humano: um e outro podem não realizar completamente o seu trabalho. Para evitar a ambiguidade, a frase poderia ser reescrita da seguinte maneira: “O computador, apesar de ser um grande aliado do ser humano, não consegue realizar todas as tarefas humanas”.

Muitos são os casos em que, por descuido ou desconhecimento, pode-se cometer ambiguidade. Ela pode ocorrer com o uso de pronomes possessivos, em frases assim: “Ana realizou a pesquisa com João e fez sua apresentação”. Ana fez a apresentação da pesquisa ou a de João? Com um pouco de atenção e dependendo do sentido desejado, poderíamos escrever assim: “Ana e João realizaram a pesquisa, e ambos fizeram a apresentação”; “Ana e João realizaram a pesquisa, e ele fez a apresentação dele” ou “Ana e João realizaram a pesquisa, e ela fez a apresentação dela”.

Comum, também, é a ocorrência de ambiguidade com o uso de pronomes relativos. Em uma sentença como “Visitamos o teatro e o museu cuja qualidade artística é inegável”, não sabemos se é o teatro ou o museu que possui qualidade artística. As sugestões seriam: “Visitamos o teatro e o museu, os quais têm qualidade artística inegável”, “Visitamos o teatro e o museu, e aquele tem qualidade artística inegável; ou “Visitamos o teatro e o museu, e este tem qualidade artística inegável”.

Por vezes, é a colocação inadequada de palavras que gera a ambiguidade. Em “O cliente aborrecido recusou o suco por causa do sabor”, não se sabe se o cliente era aborrecido ou ficou aborrecido no momento. Neste caso, a correção seria “O cliente recusou aborrecido o suco por causa do sabor” ou “O cliente, que era aborrecido, recusou o suco por causa do sabor”. Outra: “O réu negou que tivesse confessado a autoria do furto durante o depoimento”.  Agora, a ambiguidade é causada pela expressão “durante o depoimento”, que pode referir-se tanto ao verbo “negar”, quanto ao verbo “confessar”. Isso se comprova se a trocarmos de lugar: “Durante o depoimento, o réu negou que tivesse confessado a autoria do furto” ou “O réu negou que tivesse, durante o depoimento, confessado a autoria do furto”.

Nem sempre se percebe o sentido indistinto entre agente e paciente, o que causa muitos problemas. Na frase “A recepção dos noivos foi no Iate Clube”, não está claro se a recepção foi oferecida pelos noivos ou se eles foram recepcionados. Fácil é a correção: “A recepção foi oferecida pelos noivos no Iate Clube” ou “Os noivos foram recepcionados no Iate Clube”.

Para finalizar nossa relação de casos ambíguos, um mais constante: o uso de formas nominais dos verbos. O gerúndio causa ambiguidade na frase “O pai viu o filho descendo a escada”. Quem descia a escada: o pai ou o filho? Sugestões: “O pai viu que o filho descia a escada” ou “O pai, que descia a escada, viu o filho”. Antes de escrever ou falar, todo cuidado é pouco, pois “A língua dos sábios destila conhecimento, a boca dos insensatos fervilha de estupidez” (Pr 15,2).

João Maria de Lima é mestre em Letras e professor de língua portuguesa e redação há mais de 20 anos.

profjoaom@gmail.com

Crédito da Foto: Reprodução / Portugues.com.br

 

 

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