A esquecida redação oficial – Por João Maria de Lima

A esquecida redação oficial - Foto: Getty Images

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Nunca se escreveu tanto quanto hoje. O advento dos computadores, em vez de diminuir a relação dos homens com a palavra escrita, como se imaginava, provocou o aumento do seu uso. A informatização elevou a palavra escrita à condição de responsável por um dos mais importantes efeitos da globalização: a comunicação mundial via internet. Por isso, é preciso saber usar a linguagem de forma adequada, comunicando o que se deseja, evitando mal-entendidos e expressando-se sem incorrer em erros.

No ensino do português que ocorre na escola, o maior objetivo é preparar o estudante para exames vestibulares, como o Enem. Falta-lhe, todavia, uma preocupação com o ensino e a prática da Língua Portuguesa voltados para as necessidades específicas do mercado de trabalho.

Essa linguagem, a da redação oficial, comercial e cerimonialista, apresenta rituais específicos que devem ser respeitados. São muitos os casos, por questões óbvias, trataremos apenas de alguns.

É importante lembrar que, na redação oficial, não há lugar para impressões pessoais. A linguagem deve ser isenta da interferência da individualidade de quem a elabora.  Quando se escreve para uma repartição pública, por exemplo, não cabem os adjetivos “prezado”, “caro” etc. na invocação, nem os substantivos “apreço”, “consideração” etc. no encerramento, pela absoluta impessoalização do destinatário da mensagem.

Empregar com acerto a forma de tratamento adequada e escrever mantendo a uniformidade de tratamento é questão de atenção. Não se deve misturar, em uma correspondência, as pessoas gramaticais. Logo, é fundamental estar atento aos pronomes de tratamento, pois eles apresentam certas peculiaridades e são os maiores responsáveis por problemas nesse tipo de comunicação.

Duas lições são básicas: referem-se à segunda pessoa gramatical (à pessoa com quem se fala, ou a quem se dirige a comunicação) e concordam com a terceira pessoa (aquele de quem se fala). Assim sendo, os pronomes possessivos referidos a pronomes de tratamento são sempre os da terceira pessoa: “Vossa Senhoria levará seu secretário” (e não “vosso”).

Nunca é demais lembrar que o pronome “Sua Excelência” é utilizado para se fazer referência a alguma autoridade (indiretamente): “A Sua Excelência o Ministro de Estado Chefe da Casa Civil” (por exemplo, no endereçamento do expediente). O pronome de tratamento no endereçamento das comunicações dirigidas às autoridades tratadas por “Vossa Excelência” terá a seguinte forma: “A Sua Excelência o Senhor” ou “A Sua Excelência a Senhora”.  Quando o tratamento destinado ao receptor for “Vossa Senhoria”, o endereçamento a ser empregado é “Ao Senhor” ou “À Senhora”. Ressalte-se que não se utiliza a expressão “A Sua Senhoria o Senhor” ou “A Sua Senhoria a Senhora”.

Outra dica importante: os adjetivos que se referem a esses pronomes concordam com o sexo da pessoa a quem se dirigem, e não com o substantivo que compõe a locução.  Assim, se nosso interlocutor for homem, o correto é “Vossa Excelência está preocupado”, “Vossa Senhoria será eleito”; se for mulher, “Vossa Excelência está preocupada”, “Vossa Senhoria será eleita”.

Como a dignidade é pressuposto para que se ocupe qualquer cargo público, fica abolido o uso do tratamento “digníssimo” (DD), assim como fica dispensado o emprego do superlativo “ilustríssimo” para as autoridades que recebem o tratamento de “Vossa Senhoria” e para particulares. É suficiente o uso do pronome de tratamento “Senhor”. Acrescente-se que “Doutor” não é forma de tratamento, e sim título acadêmico. O tratamento por meio de “Senhor” confere a formalidade desejada.

O novo Acordo Ortográfico tornou opcional o uso de iniciais maiúsculas em palavras usadas reverencialmente, por exemplo para cargos e títulos: o Presidente francês ou o presidente francês). Porém, em palavras com hífen, após se optar pelo uso da maiúscula ou da minúscula, deve-se manter a escolha para a grafia de todos os elementos hifenizados: pode-se escrever “Vice-Presidente” ou “vice-presidente”, mas não “Vice-presidente”.

O fecho das comunicações oficiais possui, além da finalidade óbvia de arrematar o texto, a de saudar o destinatário. Atualmente, estabelece-se o emprego de somente dois fechos diferentes para todas as modalidades de comunicação oficial: “Respeitosamente”, para autoridades superiores; “Atenciosamente”, para autoridades de mesma hierarquia ou subordinadas. “Eis a voz do Senhor com força, a voz do Senhor com majestade.” (Sl 29,4).

João Maria de Lima é mestre em Letras e professor de língua portuguesa e redação há mais de 20 anos.

profjoaom@gmail.com

Crédito da Foto: Getty Images

 

 

 

 

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